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sábado, 14 de outubro de 2017

"Na nossa cultura há um modelo de professor: Jesus", por Leandro Karnal



"Na nossa cultura há um modelo de professor: Jesus. 

A maioria absoluta das pessoas no Brasil é cristã, mas a alegoria serve também para os que não são. 

Tomemos a história de Jesus independente da nossa orientação religiosa. Comparemos: Jesus teve 12 alunos escolhidos por ele! 
 Eu tenho 30, 60, 100, escolhidos por um rigoroso processo de seleção: inscreveu, pagou, entrou. 

Jesus teve alunos em tempo integral por três anos: eu tenho por duas ou quatro aulas semanais, por um período mais curto.

 Os alunos de Jesus deixaram tudo para segui-lo, o meu não deixa quase nada e não quer acompanhar nem meu pensamento, quanto mais minhas propostas existenciais.

 Fiel aos novo ditames do MEC, Jesus deu um curso superior em três anos. Para quem acredita, Ele fazia milagres, coisa que nós certamente não fazemos naquele sentido. A aula, de Jesus, assim, era reforçada por workshops. A autoestima e a confiança de Jesus era enorme: o cara simplesmente dizia que era o Filho de Deus, que ressuscitava mortos, andava sobre as águas, passava quarenta dias sem comer e não tinha medo de ninguém. Eu não tenho esta convicção. 

Melhor: as aulas eram ao ar livre, sem coordenação, sem direção, sem colegas e os pais dos alunos não apareciam para reclamar! 

Bem, após 3 anos de curso intenso com todos estes reforços, chegou a prova final.

 Na agonia do Horto os três melhores alunos dormiram, quando o Mestre estava chorando sangue. O tesoureiro da turma denunciou o professor à Delegacia de Educação por 30 moedas. O líder da classe, Pedro, negou que tivesse tido aula por três vezes diante da supervisora de ensino: nunca vi este cara antes… Outros nove fugiram sem dar notícia e não compareceram à prova final: o Calvário. 
O mais novo e bobinho, João, foi até lá, mas não fez nada para impedir que os guardas matassem o professor. Se considerarmos João , com boa vontade, o único aprovado, teremos uma média de êxito de 8.33%, baixa demais para os padrões das Delegacias de Ensino e alvo de demissão sumária por justa causa. O professor morreu e, para quem acredita, voltou para uma recuperação de férias. 

Reuniu os reprovados e disse: mais uma chance. Um dos alunos , Tomé, pediu para colocar o dedo no diploma do professor para ver se era de verdade. Primeira pergunta do líder da turma, Pedro: “Senhor, é agora que vais restaurar o reino de Israel?” Ou seja, o melhor aluno não aprendeu nada! Esta pergunta mostra o oposto da aula dada, pois ele achou que o curso tinha sido sobre política e, na verdade, tinha sido sobre Teologia… 

Objetivos não atingidos: 100% ! Novos milagres, mais 40 dias de feedback, apostilas, recuperação, reforço de férias. Final de curso pirotécnico: subiu ao céu entre nuvens e anjos assistentes-pedagógicos disseram que o mestre tinha ido para a sala dos professores eterna e não mais voltaria. 

O curso estava encerrado, todas as lições tinham sido dadas para aquela nata de 11 homens. O que eles fizeram? Foram se esconder numa casa, todos apavorados. O mestre mandou um módulo auto-instrucional de reforço, o Espírito Santo, um anabolizante. Só então, com uma força externa, eles começaram a entender, e finalmente tiveram aquela famosa reação bovina: HUMMMM…


Bem, eu disse à professora que me questionava: se Jesus teve tantos insucessos apesar de condições tão boas, a senhora quer ser mais do que Ele? 

Hoje eu diria para qualquer profissional: faça o máximo, mas apenas o máximo, e deixem o resto por conta do resto. A frase parece autista, mas é muito importante. Nós temos um limite: a vontade do aluno, da instituição e da sociedade como um todo.  Não transformamos nada sozinhos, mas transformamos. O primeiro passo é a vontade. O segundo começa daqui a pouco, naquela sala difícil, com aquela turma sentada no fundo e naqueles angustiantes dez minutos que você vai levar para conseguir fazer a chamada… Vamos lá?"

Leandro Karnal

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