"Sentada à mesa do restaurante percebi o casal discutindo do outro lado. Todos perceberam.
A noite estava linda e o panorama revelava-se perfeitamente circular, não fosse, é claro, o oblíquo daqueles dois. O agudo nas palavras, os movimentos dela rasgando o ar, as coisas mais vertiginosas do que deveriam ser, os olhares sendo ângulos retos. Dois desertos.
Rabisquei num guardanapo :
No amor tudo o que dermos jamais nos faltará.
Arrisquem um primeiro passo, atravessem a barreira do silêncio. Declarem. Seja lá o que for, declarem.
Não sejam reféns do silêncio ou do medo.
O amor é comoventemente belo. E raro.
Conservem-no.
Caminhei em direção aos dois para entregar o bilhete no mesmo instante em que ele atravessou por cima da mesa e beijou-a, calando assim aquela mágoa. Demorou no gesto, o que me fez recuar.
Acho lindo quem tem esse tipo de coragem.
E o mundo tem precisado tanto disso, dessa gente que pensa e completa o gesto, que se entrega sem constrangimentos e que enxerga a urgência do amor.
Alguns pedidos de socorro são sutis.
Ele viu.
Também vi.
Fui embora com o bilhete apertado contra o peito.
Era minha a historia que morava dentro dele."
Solange Maia
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