Acompanhei de longe a história de uma árvore do bairro Jardim Botânico, no Rio. Uma amiga soube que ela iria ser derrubada por motivos fúteis e se empenhou em salvá-la.
Primeiro ato: minha amiga subiu na árvore, que é como os ativistas ecológicos defendem seu território, e só desceu de lá depois de conseguir mobilizar a opinião pública - ou parte dela, representada por seus vizinhos e amigos.
Estava tudo correndo bem, até marchinha de carnaval a árvore ganhou em sua defesa e camisetas foram confeccionadas para angariar mais simpatizantes à causa, mas não foi suficiente. No último dia 25, a bonita árvore foi cortada, veio abaixo.
Esta não é uma crônica sobre consciência ambiental, mas poderia ser. Não é uma crônica sobre os maus tratos que a natureza sofre e poderia ser. Não é uma crônica sobre a ideia canhestra de que só é válido se manifestar contra a devastação de uma floresta, mas uma arvorezinha só, uma arvorezinha de rua, essa não vai fazer falta a ninguém.
Esta crônica poderia ser sobre a miopia de só darmos atenção às tragédias coletivas, ás tragédias televisionadas, sem nos importarmos com os erros individuais e silenciosos que são cometidos embaixo do nosso nariz. Mas não é sobre isso a crônica.
É sobre paixão.
Uma mulher declara-se apaixonada por uma blusa. Ao comprá-la, resolve sua carência por dez minutos. Logo se apaixonará por um sapato, e assim vai tentando preencher seu vazio.
Muitos são apaixonados por chocolate. Outros são apaixonados por carro, como todo brasileiro. Banalizamos o verbo, somos todos apaixonados pelo que podemos consumir. Quantos ainda são apaixonados pela vida?
Minha amiga me telefonou assim que cortaram a árvore. Chorava. Chorava sua impotência, chorava sua desolação. Era só uma árvore, e ela sentia como se fosse a morte de um parente. Ela havia defendido um bem público, não era dona da árvore, a árvore era de toda a cidade, mas alguém com uma motosserra embaixo do braço olhou para ela e disse: 'Perdeu, moça'.
A paixão pela vida se manifesta, hoje, através de poucos don quixotes urbanos. O cara que usa dinheiro do próprio bolso para montar uma peça de teatro. O atleta com deficiência física que compete nas paraolimpíadas.
O motorista que coloca o seu carro à disposição para dar conta aos que percorrem o mesmo trajeto. Os fundadores de ONGs. Os que recusam propostas milionárias para ter mais tempo livre para se dedicar ao que interessa de fato.
E o que interessa de fato? Família, amigos, amor, arte, natureza e um certo idealismo, mesmo que esteja fora de moda. É só pelo que vale brigar. Mas as pessoas brigam por uma geladeira em liquidação, brigam por uma vaga no estacionamento, brigam dentro da escola, brigam por miudezas e, quando vencem, não ganham nada.
Brigar por uma árvore é ao menos poético. Perdeu coisa nenhuma, minha amiga.
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