Quando se vê as manifestações que ocorrem no Brasil, a mensagem mais clara é contra a classe política. Pessoas cansadas de votos que mudam e que não mudam o Brasil, de leis aprovadas quando ninguém está olhando, de dinheiro público desviado para projetos sem necessidade e muitas vezes superfaturados. Então claro que é fácil simpatizar com os protestos. Falta agora definir uma visão de futuro para que o “não queremos isso” se transforme em um “aqui está o que queremos”.
É fácil encontrar união no sentimento de “nós” e “eles”, no “inimigo” em comum. Mas mesmo que os problemas estejam fáceis de ver, é preciso concordar em um caminho para a solução. Pode até ser que muita gente concorde agora que os estádios foram um gasto desnecessário, mas é isso: “foram”. O dinheiro está gasto. Quando o Brasil foi escolhido para a Copa, muita gente comemorou ao invés de protestar.
A questão é o que ocorre a partir de agora. Quais os sacrifícios que o brasileiro está disposto a fazer para pagar uma tarifa de ônibus menor, ter mais escolas, mais hospitais e educação de qualidade? Para reduzir a tarifa, o governo federal desonerou o setor, enquanto a Prefeitura de São Paulo talvez tenha de aumentar o subsídio – a compensação paga às empresas de transporte porque a conta “não fecha”, ou pelo menos é isso que se alega.
Essa desoneração e o aumento do subsídio serão pagos pelos brasileiros: a desoneração será paga na forma de menos investimentos do governo, e o subsídio na forma de desvio de recursos que iriam para outras áreas.
A classe política é sustentada pela nação para fornecer uma visão e nos convencer a segui-la. Os protestos mostram que muita gente não está convencida. Há desconfiança de que existe futuro na promoção de grandes eventos e propaganda internacional. O brasileiro quer seu dinheiro bem gasto nos lugares que o turista não vê.
Mas o governo também pode muito bem atender demandas imediatas da população com cortes e remanejamento de recursos que, a médio ou longo prazo, também trarão prejuízo aos brasileiros. É preciso ter consciência sobre o que queremos e de que forma queremos para que mais sujeira não seja colocada debaixo do imenso tapete do Estado.
Quem vai protestar pelo aumento de imposto de certos setores da sociedade que podem custear esses avanços, pela redução de salários de segmentos elitizados do setor público ou abraçar causas que não são suas, como os baixos salários dos professores? Nesses protestos sem uma causa específica, tudo que não for defendido vira um ponto ignorado ao qual o governo vai recorrer para atender as outras demandas. E, claro, é na defesa de pontos polêmicos como esses que também começarão as discordâncias.
A sociedade já entende que é capaz de ir para as ruas para mostrar seu descontentamento. Agora precisa começar a entender como a política funciona e não “perder o jogo” para os políticos, que jogam em casa. “Se não pode vencê-los, junte-se a eles”, diz o ditado, mas a existência de um vão entre “nós” e “eles” mostra que alguns políticos ainda não estão convencidos de que serão derrotados pelo interesse público.
Texto de Altieres Rohr.
Imagem de Domingos Souza.
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