O quadrinista maltês Joe Sacco, conhecido pelas obras “Palestina”, “Histórias da Bósnia” e “Notas Sobre Gaza”, concedeu uma palestra nesta terça-feira (12) na Livraria da Vila, em São Paulo, e respondeu a perguntas da plateia. Entre diversas digressões e reflexões sobre os momentos pelos quais passou na realização de seus trabalhos, Sacco discursou sobre as vantagens da união entre jornalismo e HQs e garantiu: “a única pessoa para quem devo ser um herói sou eu mesmo”.
Sacco, que participou da última Festa Literária de Paraty, falou para um público bastante diversificado de aficionados por sua obra. Pré-adolescentes dividiam espaço com senhores de idade e casais moderninhos que aguardavam ansiosos pela chance de ver o ídolo de perto e ter um livro assinado pelo autor. Franzino e não muito alto, Sacco logo demonstra seu bom humor. “Vou responder às perguntas em pé para não parecer que é alguém virtual aqui na frente”, diz arrancando sorrisos dos presentes.
Conhecido por aliar técnicas jornalísticas à arte de fazer quadrinhos, Sacco vê na junção das técnicas um trunfo de seus trabalhos. “Quadrinhos é um bom meio para o jornalismo, pois tem muita informação visual, muitas coisas que você pode demonstrar visualmente e que seriam difíceis de descrever em um texto escrito”, afirma.
Foto: Reprodução
Em "Notas Sobre Gaza", Sacco compara situação atual na Palestina com os anos 50 e 60
Outra vantagem, segundo o autor, é uma maior facilidade para que o leitor transite entre diferentes períodos históricos em uma mesma página. “Como os desenhos são similares, o leitor, sem esforço, passeia entre o passado e o futuro”, diz.
A ideia de desenvolver pesquisas no Oriente Médio veio da percepção de como os fatos eram pouco claros quando divulgados pela imprensa norte-americana. “Quando era menor, durante o colegial, não prestava atenção. Por osmose, só pelo que ouvia nos telejornais, acabei associando palestinos com terroristas”, revela antes de criticar a mídia: “quando comecei a pesquisar, fiquei abismado com o tamanho da diferença entre o que havia acontecido realmente e o que era divulgado nos meios de comunicação”.
Vivendo em Berlim no início dos anos 90, fazendo ilustrações para cartazes de shows e capas de discos, Sacco conta que a decisão de se aventurar na Palestina foi impulsiva. “Acordei um dia e pensei: ‘por que eu simplesmente não vou para lá? ’ Uma vez que plantei essa ideia na minha cabeça, sabia que eu tinha que ir, se não seria um covarde”.
As dificuldades iniciais passaram primeiramente pelo idioma. “Lembro-me de ver um grupo de crianças na rua cantando e pensei: 'deve ser algum tipo de slogan político'. Depois perguntei a um amigo palestino e ele me explicou que era o jingle de um comercial de detergente”.
Depois por uma certa timidez.” Não sabia como fazer, como conseguir as histórias e me apresentar para as pessoas”, explica antes de contar que começou a ter sucesso e progredir na apuração quando, usando transporte coletivo, era interceptado por nativos que prontamente o levavam para conhecer a região e contar suas histórias particulares. “É o que eu chamo de jornalismo acidental”, brinca.
O processo de criação do jornalista funciona da seguinte forma: primeiramente ele faz entrevistas, grava conversas, tira fotos e faz anotações. No final de cada dia, no hotel, ele mantém um diário para registrar episódios inesperados ocorridos na rua. A principal diferença dos primeiros trabalhos para “Notas Sobre Gaza”, publicado em 2009, está no aporte financeiro.
“Quando fui para a Palestina, tudo que conseguia pagar era por um falafel em barracas de rua, e eu estava ficando em um albergue da juventude, que não é o melhor ambiente para - depois de um dia duro de trabalho - reunir anotações e descansar”, diz.
Fonte: IG jovem
Sobre o perigo que envolve fazer reportagens em zonas de guerra e de fortes conflitos, Sacco é enfático: “sempre fui muito cuidadoso, não assumo riscos desnecessários. Mesmo assim, às vezes estamos em situações extremamente perigosas e não percebemos”.
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