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segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

ARTE NA EDUCAÇÃO POR UMA CULTURA DE PAZ



O mundo moderno dá a luz a formação de uma civilização barbarizada, civilização onde impera o medo, a tristeza, a incerteza e a falta de oportunidades iguais para todos, principalmente, para as pessoas marginalizadas e excluídas socialmente. Porém, ao mesmo tempo, vislumbra-se possibilidades de mudanças nesse cenário caótico, as quais podem ser capazes de aplacar tais angustias e o doloroso sentimento de impotência diante do processo de desconstrução civilizatória que está em curso. Pensando nessas possíveis possibilidades, apresento aqui a Arte e a Educação como elementos formativos, caminhando juntas, capazes de oportunizar o crescimento e, por conseguinte, a formação de indivíduos preparados para viver nas sociedades em constante metamorfose, com mais esclarecimento, consciência crítica, responsabilidade consigo mesmo e com o outro, um ser íntegro e do bem.







Cultura de paz, um desejo antigo da humanidade

Estatua por la Paz Mundial, instalada en la plaza Cacique Colipí de Copiapó, Chile. https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Estatua_Paz_Mundial_Copiapo.jpg



“Irei defender a causa da beleza perante um coração que sente seu poder e o exerce, e que tomará a si a parte mais pesada de meu encargo nesta investigação que exige com igual frequência, o apelo não só a princípios, mas também a sentimentos”. (Schiller; 1ª carta: 1991, p.35).

A intolerância é responsável por grandes crimes cometidos pela humanidade. O preconceito, a arrogância e a incapacidade de aceitar diferenças são traços marcantes na história dos povos. Mesmo após séculos de guerras – todas inflamadas pelos mais ínfimos motivos – ainda assistimos ao massacre terrível da própria condição humana. Ainda depois de construída uma civilização altamente complexa, tecnológica, racional, temos que conviver com a miséria absoluta e a violência explosiva. Parece que em algum ponto a humanidade insiste em errar.

Ao invés de criar uma cultura da solidão, hegemônica nos países que primam pela concentração de renda, taxas elevadas de desemprego, baixo poder aquisitivo dos seus povos e privilégios das classes políticas, o correto seria inserir na consciência dos cidadãos desses países, a cultura da solidariedade.

No lugar do incentivo constante à competição, que premia o indivíduo “vitorioso”, deveria ser incentivado a união solidária que divide responsabilidades e partilha conquistas, tais como: a justa distribuição de renda, a ampliação e democratização de oportunidades, mais justiça na distribuição de recursos à população, como forma de fortalecer o sentimento de justiça social entre todos. Ao ser levado a cabo essa forma de viver e conviver, a cultura de paz, certamente se fará presente e induzirá consciências e as influenciará na direção de um mundo mais tolerante e, nesse caso, a uma nação mais humana, mais ética e mais justa para todos.

No contexto da paz como cultura aberta e democrática, as inovações são sempre bem vindas e essas ideias abrem as portas para responder a necessidade de se construir um novo momento em todas as áreas dos saberes e fazeres, popular e científico, diante da crise em que o mundo vive hoje, como pensava o educador Paulo Freire, lembrado nas palavras do filósofo Jaime José Zitkoski:

“O desafio freiriano é construirmos novos saberes a partir da situação dialógica que provoca a interação e a partilha de mundos diferentes, mas que comungam do sonho e da esperança de juntos construirmos nosso ser mais”. (ZITKOSKI, 2010, p. 118).

Assim, diante dessa possibilidade de se construir novas alternativas de sociedade a partir do conhecimento, para instaurar uma nova ambiência nos territórios de maior conflito entre iguais, que hoje são hierarquizados apenas pelo critério da força e pela ausência da lei. Podemos dizer que essa nova ambiência poderá ser chamada de território da paz, lugar da inserção dos jovens no mundo da arte e da educação, lugar da integração de todos em direção a uma cultura promotora da não violência.

A redenção do Brasil passa por uma formação ética e estética do seu povo

“Que ver não é pensar e pensar não é ver, mas que sem a visão não podemos pensar, que o pensamento nasce da sublimação do sensível no corpo glorioso da palavra que configura campos de sentido a que damos o nome de ideias” (Chauí, 1999, p. 60)


No Brasil, milhões de pessoas sobrevivem à margem da sociedade, apertadas econômica, social e culturalmente. O desemprego tem sido a mais humilhante dessas manifestações de crueldade, agravando, ainda mais, o triste quadro de desamparo social de nossa gente.

A educação surge nesse cenário desalentador como a tábua de salvação de todos os males. Mas, que tipo de educação poderá mudar essa realidade? Será a reprodutora da ideologia dominante, ou outra capaz de libertar o homem dessas amarras projetando-o num futuro mais promissor através de um processo de produção artístico-cultural? Eis aqui o objetivo maior desse artigo, que é tentar mostrar elementos pertinentes à atividade educacional que possam contribuir para a resposta da pergunta que não quer calar: “educar para quê? ”.

Criar uma cultura de paz no seio da sociedade hoje, passou a ser uma questão de prioridade nacional. Quando se observa à barbárie se alastrar pelo país e ser a pauta temática de maior relevância nos meios de comunicação de massa, torna-se inevitável a dimensão do pavor, fazendo com que a sociedade conviva constantemente com a sensação de pânico coletivo.

A violência urbana nos últimos tempos tem tomado proporções imensas, nunca antes imagináveis. Ela expandiu-se de tal forma que, hoje, instituições sociais mais sólidas e intransponíveis, no que se refere a sua constituição ética e moral, estão sendo permeadas pelos tentáculos desse monstro nefasto.

A família e a escola são dois exemplos categóricos disso. Tanto uma como a outra estão sendo alvo constante dos agentes multiplicadores da cultura de violência. Entre estes podem ser destacados: a fome, a miséria, a concentração de renda, o desemprego, a ignorância.

No quadro político-econômico e social em que nos encontramos, sobra pouco espaço para que seja considerada relevante alguma propensão humana à maldade, mesmo porque, os veículos de comunicação do país, que deveriam estar a serviço da sociedade, não estão apresentando uma programação capaz de contribuir com um processo de formação humana mais digno. Eles trazem nos quadros de programação uma cultura inútil, que só contribui para deformar a personalidade dos indivíduos.

Baseado nesta realidade, já se tornou comum no Brasil dizer que estamos vivendo uma guerra civil. Não é por acaso escutarmos pessoas defendendo verdadeiros absurdos como: pena de morte, execução sumária de pessoas presas por suspeitas de cometerem delitos, antes mesmo de serem devidamente julgadas, redução da maioridade penal de jovens adolescentes infratores, que, na maioria das vezes, são abandonados pelos poderes constituídos e pela sociedade.

Parte desses agentes sociais defendem, ou tampouco se importam com as condições de vida repugnantes na qual se encontra o sistema prisional brasileiro, cujos cárceres em que são lançados os nossos compatriotas, não mantêm o mínimo de zelo necessário à proteção da dignidade humana. Por trás desse raciocínio vil e covarde emerge uma confissão de culpa – a de que, na verdade, não é possível mudar o mundo que gera tantas vítimas.

Já no século passado Vitor Hugo advertiu: “Quem abre uma escola fecha uma prisão”. Muito antes, Pitágoras falou: “Educar as crianças, para que não seja necessário castigar os adultos”. Nos dias atuais, Cesare La Rocca (1990) ensina:

“Quando uma criança de dez anos grita na cara do educador “eu não tenho nada a perder”, então algo de terrível aconteceu? A infância foi destruída e suas características fundamentais, que são aquela de sonhar e desejar, foram barbaramente assassinados” (p.10).

Não é, portanto, nenhuma novidade, nem tampouco absurdo, exigir que se invista cada vez mais na inserção das artes no processo educativo. As junções desses dois elementos de formação humana serão capazes de arrebentar as grades, abrir as portas e liberar todos nós dessa antiga prisão chamada ignorância.

Agraciado com o Prêmio Educador 2010, pelas Revistas Educação e Cidade escola Aprendiz, e o Prêmio Trip Transformadores de 2011, pela Revista Trip o italiano Cesare La Rocca, idealizador do Projeto Axé, na Bahia, é um raro exemplo de vida dedicada a esse projeto que une arte à educação, pois, para ele, “a arte e a cultura precisam estar a serviço da educação”.

É exatamente nessa linha de raciocínio que os projetos de políticas e reformas educacionais deveriam se espelhar, ou seja, apreender as ideias que germinam nos movimentos populares a cada dia, e transformá-las em resoluções institucionalizadas, inserindo-as como currículos essenciais a serem desenvolvidos no âmbito das práticas pedagógicas atuais das nossas escolas. Ideias, como a que teve esse italiano natural de Florença – berço do Renascimento – quando criou o Projeto Axé da Bahia, precisam ser disseminadas por todo país, pois somente através de uma educação que valorize e respeite à diversidade cultural de cada região, poderemos, quem sabe um dia, reverter o atual quadro de banalização da violência que insiste em nos rodear. Talvez um modelo de educação como a do educador pernambucano, Paulo Freire, que conseguia ver uma dimensão política no ato de educar, possa, quem sabe, nos redimir dessa dívida histórica que nós educadores temos com as classes menos favorecidas de nossa sociedade.

Diante do exposto urge a necessidade de uma reflexão profunda sobre quais caminhos deve seguir a nossa educação e qual é o nosso papel, enquanto educador, nesse contexto de social de agravamento da violência, em vias de se tornar um estado de barbárie generalizada, devido, em boa parte, pela ineficiência e degradação das instituições públicas brasileiras. Vamos assistir passivamente o caos se estabelecer em nosso meio ou vamos, desde já, procurar uma alternativa educacional capaz de demover as nossas crianças e jovens do ímpeto destruidor.

Theodor W. Adorno em sua obra “Educação e Emancipação” (1995), advertia os educadores:

“...contra os efeitos negativos de um processo educacional pautado meramente numa estratégia de “esclarecimento” da consciência, sem levar na devida conta a forma social em que a educação se concretiza como apropriação de conhecimentos técnicos” (p.04).

A ação de educar necessita de mais elementos formativos para tornar o homem um ser melhor, mais evoluído em todas as suas dimensões. É exatamente neste ponto que o pensar e o fazer artístico devem permear o processo educativo mostrando as crianças e jovens aprendizes o belo, ou melhor, a beleza estética das coisas. Assim como disse Shiller em sua 10ª carta inscrita na obra “Cartas sobre a Educação Estética da Humanidade” (1991: p.29), que: “... a beleza deve libertar o homem de dois erros e desvios – da brutalidade física do selvagem e da decadência requintada do bárbaro culto”.

Precisamos urgentemente criar uma cultura de paz em nossa sociedade e nada melhor para isto do que inserirmos a arte nas escolas, mas, não como uma disciplina isolada, desvinculada das demais, dentro da grade curricular, com carga-horária extremamente reduzida.

Certamente, levar a arte para a escola dentro dessa perspectiva pedagógica de ensino, não irá fazer diferença nenhuma no cenário atual. O que vai fazer diferença de fato será mudar a filosofia de ensino e a prática docente acerca dos conteúdos artísticos no cotidiano das salas de aula, e a melhor forma é a apontada pelos educadores Rubem Alves e Duarte Jr., que é educar na perspectiva da arte, ou seja, educar como se estivesse produzindo arte. Ou fazemos isto, ou iremos continuar a eterna discussão do tema “educar para quê? ”.

Referências

ADORNO, Theodor W. Educação e Emancipação / Theodor W. Adorno; Tradução Wolfgan Leo Maar. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995, p.11.

CHAUÍ, Marilena. Janela da alma, espelho do mundo. In: NOVAES, Adauto (Org.). O olhar. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p. 31-63.

Revista Educação. Ano 26. Nº 222. Outubro / 1999. Editorial – A Educação é uma arma. Ed. Segmento, p.11.

________________. Ano 27. Nº 235. Novembro / 2000. Pedagogia do desejo. Ed. Segmento, p.44-48. ROCCA, Cesare de Florio La. Projeto Axé, por uma organização italiana voltada ao movimento de meninos e meninas de rua, 1990.

SHILLER, Friedrich. Cartas sobre a Educação Estética da Humanidade. EPU (Editora Pedagógica e Universitária LTDA), 1991, p.29.

ZITKOSKI, Jaime José. Diálogo/dialogicidade. In: STRECK, Danilo Romeu; REDIN, Euclides; ZITKOSKI, Jaime José (Org.). Dicionário Paulo Freire. 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica. 2010. 439 p.




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