sexta-feira, 15 de maio de 2015

José Paulo Paes e a literatura que encanta!

Por Lorenna Braga e Ezequias Corrêa


O objetivo deste trabalho é fornecer dados sobre a produção poética de José Paulo Paes, partindo de uma análise biográfica e não de uma perspectiva da escola literária ao qual ele está inserido, o que seria mais usual. A proposta é fazer um levantamento da sua poesia desde os seus primórdios até o momento em que o poeta alcança a consagração enquanto escritor de nossa literatura. O encantamento de José Paulo Paes com a poesia pré-modernista de Augusto dos Anjos, o contato com a produção literária de Machado de Assis, bem como com o trabalho de Edgar Allan Poe são fatores relevantes para a construção poética do autor em questão, assim como são relevantes também a sua amizade com os modernistas Mário de Andrade, Drummond de Andrade e outros. É dentro desse quadro que se estabelece a produção poética de José Paulo Paes e é dentro desse enfoque que este trabalho o busca analisar.





INTRODUÇÃO


Apesar de sua literatura ser ainda desconhecida do grande público, algo que se justifica pela aversão de uma parte da crítica literária por poesias infantis, José Paulo Paes começa a ganhar espaço entre os grandes poetas brasileiros. Este trabalho tenciona fazer um apanhado da produção poética deste autor a partir de suas vivências, suas influências, sua biografia.


A decisão de se falar da produção poética de José Paulo de acordo com as suas experiências e biografia tem a ver, principalmente, com o fato de que este poeta era avesso a qualquer forma de convenção, ele entendia que apesar de pertencer cronologicamente à geração modernista de 45 tinha mais característica em comum com os primeiros modernistas, a geração de 20, como Mário de Andrade, Drummond de Andrade, Oswald de Andrade e outros do que com os escritores de sua época.


Além das influências literárias, José Paulo Paes foi fortemente marcado pelos intelectuais com quem conviveu e pelos lugares que frequentou como o círculo do café belas-artes, um lugar que reunia escritores, jornalistas e toda sorte de pessoas interessadas nas artes.


Desde a sua tenra idade até os seus últimos dias de vida, o escritor José Paulo Paes não cessou de receber influências e de ser ele próprio a influência para vários outros escritores que se iniciavam nos rumos da literatura. Com toda versatilidade de um poeta modernista e fruto de uma geração de escritores que bebeu em todas as fontes, José Paulo Paes só poderia ter uma poesia que encanta adulto e criança.


SOBRE JOSÉ PAULO PAES 


Nascido em Taquaritinga-SP, a 22 de Julho de 1926, José Paulo Paes foi um dos mais importantes poetas da nossa literatura, foi também um respeitável tradutor de obras literárias como os poemas do inglês Levis Carroll e de clássicos da lingüística, sobretudo da semiótica, área em que tinha grande interesse. Ele era fluente nas línguas inglesa e francesa, que aprendeu quando ainda cursava o ensino ginasial, também traduziu obras de escritores russos, idioma que estudou e aprendeu sozinho com as suas habilidades de autodidata.






AMAVA A LITERATURA E A QUÍMICA


José Paulo Paes era um leitor voraz e amante incondicional da literatura, que aprendeu a gostar quando ainda morava na casa de seus avôs, mas apesar de seu amor pelas letras, o escritor paulista tinha formação técnica no curso de química que era também uma de suas paixões, sobre a sua escolha pelo ramo da química, o próprio poeta nos esclarece:


Um curso universitário exigiria mais oito anos de estudo. Era de mais para quem queria se livrar o quanto antes da dependência financeira para com o pai e cuidar da própria vida. Ainda que atraído pela literatura, nem de longe me passou pela cabeça cursar letras, de onde eu sairia professor de português [...] não gostava de escola. Achei então que um curso de técnico de química seria uma boa opção. (Paes, 1996, P.29)


Outra razão que contribuiu para que José Paulo Paes optasse pelo curso de química foi o fato dele ter sido fortemente afetado pelos quadrinhos que traziam as aventuras de Flash Gordon e posteriormente pelo seriado de televisão do mesmo super-herói.



Penso que as histórias de Flash Gordon deve ser creditado o meu precoce interesse pelas ciências, em particular pela química. Num quartinho de madeira feito especialmente por meu pai nos fundos do quintal, montei meu laboratório. Para equipá-lo além de vidro de remédios vazios [...] provetas, copos graduados, tubos de ensaio e varetas de vidro, daquelas que se podem modelar no fogo. (Paes, 1996, P. 17)



José Paulo Paes trabalhou por vários anos na indústria química até se decidir pela literatura, atitude que recebeu total apoio de sua esposa Dora para quem dedicaria todas as suas poesias. Dora era a principal incentivadora da produção de José Paulo Paes.





Quando José Paulo Paes sai de Taquaritinga e vai morar em Araçatuba, onde cursa o ensino ginasial, ele entra em contato com uma produção literária que até então lhe era desconhecida, entre as obras com as quais toma contato nesse período destacam-se ‘o Corvo’ de Edgar Allan Poe, ‘Dom Casmurro’ e ‘Memórias Póstumas de Brás Cubas’ de Machado de Assis e ‘Eu e outras poesias’ de Augusto dos Anjos. Sobre a influência de Augusto dos Anjos em sua produção poética José Paulo Paes afirma:




Sobre o poema o ‘corvo’ de Edgar Allan Poe, Paes (1996, p.27) escreveu: “apressei-me a ler o poema. E me encantei com a figura fatídica do corvo a repetir o seu ‘nunca mais!',cada vez com um novo significado, para marcar o desconsolo pela perda da mulher amada, a desolação da viuvez e a irreparabilidade da morte”. Foi por essa época que José Paulo Paes produziu um poema intitulado ‘A Edgar Allan Poe’ em que presta uma homenagem ao poeta estadunidense referendando o famoso poema ‘O Corvo’.




Anos mais tarde José Paulo Paes publica o poema intitulado “a casa”, em que revela com o tom sombrio e fantasmagórico advindos da forte influência de Edgar Allan Poe em sua poesia. Conta o poeta que este poema fora criado a partir de um sonho e que neste sonho ela era um menino voador que era levado por um pássaro até a antiga casa de seu avô em Taquaritinga.






Nesse período, ele também se encanta com os romances machadianos em que percebe a predominância do tempo psicológico, característica que diferia das suas leituras de infância. A esse respeito José Paulo Paes afirma:


[...] as reflexões, entre amargas e cínicas, entremeadas à desacidentada narrativa do D. Casmurro e das Memórias póstumas de Brás Cubas iriam mostrar-me que um romance não precisa estar recheado de situações de perigo nem ter necessariamente personagens de estatura heróica para prender a atenção do leitor. (1996, p. 27)


Tempos mais tarde, com uma leitura mais madura das obras de Machado de Assis, o poeta José Paulo Paes escreveu dois ensaios chamados Gregos e baianos, ambos publicados no ano de 1985.





Quando se muda para Curitiba, José Paulo Paes trava contato com um grupo de intelectuais que tinha como objetivo renovar a poesia e levar as inovações modernistas para o Paraná. Esse grupo de intelectuais formado em sua maioria por jornalistas, escritores, artistas plásticos, músicos, comunistas e pequenos corretores encontravam-se no café belas-artes que se situava na rua quinze.


José Paulo Paes eterniza o café belas-artes, fechado logo após a sua partida de Curitiba, em um poema chamado “balada das belas-artes” publicado no livro “Prosas seguidas de Odes mínimas” ele presta homenagem ao lugar onde se reunia com amigos para discutir literatura.

Sobre o mármore das mesas

do Café Belas-Artes

os problemas se resolviam

como em passe de mágica.



[...]



O verso vinha fácil

o conto tinha graça

a música se compunha

o quadro se pintava.



Doía muito menos

a dor-de-cotovelo,

nem chegava a incomodar

a falta de dinheiro.



Para o sedento havia

um copo de água fresca,

média pão e manteiga

consolavam o faminto.



Não se desfazia nunca

a roda de amigos;

o tempo congelara-se

no seu melhor minuto.



[....] (1996, p .36)


A CARTA DE DRUMMOND


A carta que Carlos Drummond de Andrade enviou a José Paulo Paes tornou-se um divisor de águas em sua produção literária, tanto que após muitos anos quando já era um escritor consagrado, ele afirmava que a carta de Drummond o tirara das nuvens e o colocara no chão que é o lugar onde todo escritor deve estar. Entre outras coisas a carta dizia:





Depois da carta de Carlos Drummond de Andrade, José Paulo Paes passa a buscar em sua poesia a realização de uma escrita que expusesse mais suas perspectivas do que com algo que lembrasse as vozes de outros poetas, em particular os da geração de 22. Após esse episódio é que se sobressai, em sua literatura, o poema piada, o poema de engajamento e, na última fase de sua produção poética, a poesia infantil.





José Paulo Paes foi casado com a bailarina Dora, seu grande amor, a quem dedicou diversos poemas. Sobre a convivência com Dora José Paulo Paes (1996. P. 63) escreve: “Desde que nos casáramos, ela nunca havia deixado de trabalhar; seus ganhos se somavam aos meus para fazer frente às despesas da casa. Conosco não havia o meu e o teu; havia o nosso. E o nosso trem de vida era e continua a ser modesto”. Entre os poemas dedicados à Dora destacam-se “madrigal” em que ainda predomina o poema piada herdado da geração de 22 e “De mãos unidas” de caráter confessional.





DE MÃOS UNIDAS









Glaura foi à filha de José Paulo Paes que morreu ainda recém-nascida. Depois de Glaura, o casal não teve outros filhos, mas a rápida passagem de Glaura deixou no poeta um profundo sentimento de saudade que se notabilizou em sua poesia. Para Glaura, ele escreveu um poema intitulado “nana para Glaura” onde faz uma relação entre o sono de uma criança e a morte da filha.








José Paulo Paes sofria de um sério problema na perna direita, se tratava de uma gangrena que da qual se curou, mas tempos depois ela voltou atacando a perna esquerda que teve de ser amputada. Para a sua perna amputada José Paulo Paes escreveu um poema intitulado “ode a minha perna esquerda”.









Ao todo José Paulo Paes soma quase trinta obras publicadas que são geralmente divididas em poemas para adultos e poemas infantis, apesar do escritor não simpatizar muito com essa divisão. As obras para o público adulto e que representam primeira fase do escritor são:





A primeira fase de sua poesia em que se verifica a forte influência da geração de 22 é marcada por uma forte uma produção engajada, é desse período o poema “cristandade” em que se nota o tom irônico e denunciativo.









José Paulo Paes foi um poeta que trafegou entre os mais diversos rumos da literatura, foi tradutor, ensaísta, crítico literário e acima de tudo foi um poeta que mostrou em sua poesia as mais diversas influências desde a poesia engajada de caráter contestador até a poesia infantil que tinha como intenção maior o divertimento.





Fato curioso na história de José Paulo Paes, no que diz respeito à literatura infantil, é que ele sempre sentiu grande aversão pelas poesias infantis encontradas nos manuais do ensino ginasial. Para José Paulo Paes aquelas poesias não chamavam a atenção das crianças por não possuírem graça e não representarem a realidade de uma criança. Ele fez a análise de um antigo poema que encontrou nesses manuais.








A poesia de José Paulo Paes diferencia-se das demais poesias infantis, justamente por trazer o riso, a alegria e o lúdico de uma maneira muita criativa em que se sobressai os jogos de palavras e as rimas com histórias muito bem elaboradas que prendem a atenção tanto de adultos quanto de crianças. Prova disso é o poema “cemitério” em que o poeta faz uso das rimas e do jogo de palavras.


















CONSIDERAÇOES FINAIS


José Paulo Paes tem seu lugar garantido entre os grandes nomes da literatura brasileira, sobretudo porque soube usar todo o seu potencial criador para desenvolver uma poesia totalmente diferenciada.


O aprimoramento de sua poesia infantil foi resultado de muito labor literário e ao contrário das poesias infantis insossas e pedagogizantes que ele encontrara em seus manuais, José Paulo Paes acreditava que era (PAES, 1996. P.16) "pelo trampolim do riso, não pela lição de moral, que se chega ao coração das crianças. Até lá procuraria eu chegar com as brincadeiras de palavras de meus poemas infantis".


José Paulo Paes morreu, mas a sua obra permanece cada vez mais viva e conhecida em todo mundo provando que a sua poesia superou o tempo de sua criação e alcançou outras gerações, confirmando o talento de seu autor e a beleza de sua obra.


Apesar de ter sido reconhecido como grande poeta ainda em vida, José Paulo Paes entendia que não estava à altura de Manuel Bandeira, por exemplo, e se auto denominava um poeta como outro qualquer. Para PAES (1996, p.78)






REFERÊNCIAS
PAES, José Paulo. Quem, eu? Um poeta como outro qualquer. 4. ed. São Paulo: Atual, 1996.
PAES, José Paulo. Melhores poemas. Seleção de Davi Arrigucci Jr. São Paulo: Global, 1998.
PAES, José Paulo. Poemas para brincar. São Paulo: Áti
PAES, José Paulo. Lé com Cré. São Paulo: Ática, 1994. ca, 1994.
Revista Cult. Entrevista: A aventura Literária de José Paulo Paes. Número 22. maio de 1999. São Paulo: Lemos.


¹Acadêmica do curso de letras pela Universidade do Estado do Amapá. E-mail: lolo-luanda@hotmail.com
²Acadêmico do curso de letras pela Universidade do Estado do Amapá. E-mail: letras.ap@hotmail.com

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