segunda-feira, 23 de abril de 2012

BORGES, CAMÕES, DRUMMOND E O UNIVERSO

Grandes autores da literatura mundial mais uma vez, por meio de suas obras, se encontram.
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“Então ocorreu o que não posso esquecer nem comunicar. Ocorreu a união com a divindade, com o universo (não sei se estas palavras diferem). O êxtase não repete seus símbolos; há quem tenha visto Deus num resplendor, há que o tenha percebido numa espada ou nos círculos duma rosa. Eu vi uma Roda altíssima, que não estava diante de meus olhos, nem atrás, nem nos lados, mas em todas as partes, a um só tempo. Essa Roda estava feita de água, mas também de fogo, e era (embora se visse a borda) infinita. (...) Ali estavam as causas e os efeitos e me bastava ver essa Roda para entender tudo, interminavelmente. Oh, felicidade de entender, maior que a de imaginar ou que a de sentir! Vi o universo e vi os íntimos desígnios do universo. Vi as origens narradas pelo Livro do Comum. Vi as montanhas que surgiram da água, vi os primeiros homens com seu bordão, vi as tinalhas que se voltaram contra os homens, vi os cães que lhes desfizeram os rostos. Vi o deus sem face que há por trás dos deuses. Vi infinitos processos que formavam uma só felicidade e, entendendo tudo, consegui também entender a escrita do tigre”.
(Fragmento do conto “A escrita do Deus”, de Jorge Luis Borges, que integra o volume “O Aleph”)
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“Não andam muito que no erguido cume
Se acharam, onde um campo se esmaltava
De esmeraldas, rubis, tais que presume
A vista que divino chão pisava.
Aqui um globo vêem no ar, que o lume
Claríssimo por ele penetrava,
De modo que o seu centro está evidente,
Como a sua superfície, claramente.
Qual a matéria seja não se enxerga,
Mas enxerga-se bem que está composto
De vários orbes, que a divina verga
Compôs, e um centro a todos só tem posto.
Volvendo, ora se abaxe, agora se erga,
Nunca se ergue ou se abaxa, e um mesmo rosto
Por toda a parte tem, e em toda a parte
Começa e acaba, enfim, por divina arte,
Uniforme, perfeito, em si sustido,
Qual enfim o arquétipo que o criou”.
(Estrofes 77, 78 e 79 respectivamente do Canto X de “Os Lusíadas”, de Luís de Camões)

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“E como eu palmilhasse vagamente
Uma estrada de Minas, pedregosa,
E no fecho da tarde um sino rouco
Se misturasse ao som de meus sapatos
Que era pausado e seco; (...)
A máquina do mundo se entreabriu
Para quem de a romper já se esquivava
(...)
Abriu-se majestosa e circunspecta,
Sem emitir um som que fosse impuro
Nem um clarão maior que o tolerável
Pelas pupilas gastas na inspeção
Contínua e dolorosa do deserto,
(...)
As mais soberbas pontes e edifícios,
O que nas oficinas se elabora,
O que pensado foi e logo atinge
Distância superior ao pensamento,
Os recursos da terra dominados,
E as paixões e s impulsos e os tormentos
E tudo o que define o ser terrestre
Ou se prolonga até nos animais
E chega às plantas para se embeber
No sono rancoroso dos minérios,
Dá volta ao mundo e torna a se engolfar
Na estranha ordem geométrica de tudo,
E o absurdo original e seus enigmas,
Suas verdades altas mais que tantos
Monumentos erguidos à verdade;
E a memória dos deuses, e o solene
Sentimento de morte, que floresce
No caule da existência mais gloriosa,
Tudo se apresentou nesse relance
E me chamou para seu reino augusto,
Afinal submetido à vista humana”.
(Fragmento de “A máquina do mundo”, de Carlos Drummond De Andrade)

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