quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

O prolífico artista abre as portas de sua residência e revela seu universo feito de moda, arte e rock’n’roll


Jean-Charles de Castelbajac no seu ateliê, usando suéter de Fred Flintstone que ele desenhou, em 1982

Artista plástico, estilista, ilustrador, escritor, designer e colecionador – muitas são as facetas de Jean-Charles de Castelbajac. Pioneiro em tecer laços entre a moda e a arte, o que começou a praticar nos anos 1970, ele também soube, desde cedo, fazer colaborações – e amizades – com grandes nomes, como André Courrèges, Keith Haring e Basquiat. Com quase 50 anos de uma carreira pontuada por trabalhos célebres – pense no manto do papa João Paulo II, no figurino de Farrah Fawcett para o seriado As Panteras ou ainda em peças para Beyoncé, Lady Gaga, Kanye West e outros –, é um homem do presente, sem saudosismos. “Meu tempo é agora”, dispara. No dia 27 do mês passado, ele desembarcou no Brasil para assinar a cenografia de fim de ano do Shopping Cidade Jardim, batizada de O Natal das Cores. Antes de sair de Paris, porém, recebeu Casa Vogue em sua residência-ateliê para revelar como é viver em uma verdadeira casa de artista.
Detalhe do mesmo local, com pintura na parede feita pelo artista e jaqueta laranja assinada por ele para a marca francesa Lafont – sobre a mesa, pintura Pirate bay, do grego Miltos Manetas
No living, o lado pop do artista é traduzido nas cadeiras que ele mesmo desenhou em 1987 (ao redor da mesa) e na poltrona-protótipo de Ettore Sottsass (1983) – ao fundo, pintura Lucy in the sky, de Robert Malaval, maquete do navio de guerra comandado pelo tio de Jean-Charles e tela de Chris Johansen

Nosso mergulho em seu mundo particular aconteceu num domingo ensolarado. Fomos recebidos por Pauline de Drouas, sua companheira, que nos guiou entre os arbustos à inglesa até a entrada principal do lar, uma pequena varanda cujo acesso se faz por uma escada de pedra guiada por balaustradas. Estava claro que entraríamos num universo de arquitetura clássica, mas os elementos bem-humorados vistos logo na entrada já sinalizavam se tratar do território pop e artsy que Jean-Charles domina: um globo de espelhos pendendo do teto e uma bola de rugby com as cores da França fazendo às vezes de decoração (ele não joga!) convivem com uma cabeça de alce empalhada – vintage, é claro.
O inconfundível traço de Castelbajac, feito com as canetas Posca, sua 'arma' do cotidiano

“O que mais me encantou aqui foi o jardim, a calma e o silêncio. E ao mesmo tempo a possibilidade de estar no centro da cidade, de ter acesso fácil à energia de Paris”, conta, entre uma foto e outra. “O bairro também foi decisivo, tenho vários amigos que moram aqui perto como [os fotógrafos] Dominique Isserman e Oliveiro Toscani. Formamos uma espécie de comunidade”, se anima o francês, que vive no 14e arrondissement há cinco anos.
O inconfundível traço de Castelbajac, feito com as canetas Posca, sua 'arma' do cotidiano
No quarto de hóspedes, Jean-Charles, de casaco assinado por ele em 1987, senta-se na poltrona Joe (1968), de Paolo Lomazzi, Donato D'Urbino e Jonathan De Pas, ao lado da luminária concebida pelo dono da residência – na parede, desenhos de David Shrigley (no canto, à esq.) e Ruiz & Stephinson (mão) e fotografias de August Sanders (no canto, à dir.)

As cores vibrantes e o mix de obras de Jean-Charles com itens de outros artistas chamam a atenção. Numa das paredes da sala um enorme afresco desenhado por ele serve de fundo para uma mesa cheia de fotos, desenhos e objetos insólitos. Uma ilustração original de Keith Haring fica ao lado de um retrato do escritor Jean Genet feito por Brassaï, um livro de histórias da idade média e a imagem de seus pais, os marqueses de Castelbajac. “Aqui existe uma mistura de novidades na minha vida e outras que me são muito caras”, explica. “São coisas especiais como esta vitrola que ganhei aos 16 anos, esta garrafa de armanhaque inventada por meu filho Jean-Louis, este boné composto por peças de Lego que fiz com a New Era para o Kanye West ou aquela maquete de navio de guerra em cima da lareira, uma réplica de uma embarcação comandada por meu tio.”
Na sala, escultura de Thomas Hirschhorn e cadeira criada por Castelbajac em parceria com Kanye West antecedem estante de Ettore Sottsass, presenteada pelo próprio designer

Jean-Charles aponta ainda para a coleção de canetas Posca, sua “arma” do cotidiano. Sua morada é, de fato, onde a vida íntima se mistura com a criação. “Simultaneamente um local de repouso e de conquistas”, declara. “Aqui tenho contato próximo com a natureza e com as estações do ano, é onde dialogo com o vento, com o invisível.”
Um dos grafites do morador que aparecem em vários pontos da casa

Ele confessa saber pouco sobre o Brasil, mas tem lembranças fortes de uma viagem feita em 1981. “Fui ao país num dos últimos voos do Concorde, junto com Jean-Paul Gaultier, Claude Montana e Thierry Mugler. Os outros passageiros eram quase todos da nossa equipe, havia uma atmosfera de turnê de rock stars. Desfilamos no Rio e em São Paulo e fomos muito bem recebidos.
Instalação luminosa Lost paradise, concebida por Castelbajac em 2000, adorna o jardim

Mas o que mais me impressionou foram as paisagens de Manaus e o Rio Amazonas, um lugar que eu sonhava em conhecer desde criança.” Dono de um universo tão colorido e lúdico, ter a oportunidade de trabalhar num país tropical parece um desejo de natal delirante – agora, concretizado.

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Detalhe do ateliê destaca pintura de Mister Sun, um dos personagens favoritos de Castelbajac e desenho de Brisa Day Roché
Entre livros inspiracionais e criações próprias, como a pintura The Film e o anjo azul, peças de valor sentimental, como o urso de pelúcia do filho e a boneca com o New Look da Dior que Castelbajac ganhou da irmã.
Fonte: Casa Vogue

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