RIO — Manoel de Barros já tinha seu lugar garantido na estante de Jonas Bloch quando, há alguns anos, o ator ganhou uma coleção completa dos livros do poeta mato-grossense. Ao se embrenhar no universo do autor, não só se apaixonou como teve uma vontade incontida de compartilhar sua epifania com as pessoas. Compartilhar não no modo facebookiano, mas no mais íntimo, com o público, o que, como diz ele, “é a melhor coisa que pode acontecer a um ator”. E, assim como o poeta recusava a palavra “acostumada”, o ator pôs-se a trabalhar num espetáculo que fosse, ele também, desacostumado — no caso, que não se constituísse apenas num recital de poesia. O produto desse encontro pode ser visto no Teatro Candido Mendes, “O delírio do verbo”.
— A poesia dele não é tradicional, de rimas e métricas. São textos carregados de lirismo e humor — diz Bloch, que selecionou aquilo que “batia no coração” e que fosse viável para o teatro, isto é, que funcionasse dramaturgicamente.
No processo, pôde constatar certas afinidades com o poeta, como terem passado, os dois, um período de suas vidas num colégio interno, o que marcaria ambas as trajetórias.
— Minha mãe ficou viúva muito cedo, e precisava trabalhar. Aos 3 anos ela me pôs num internato em Petrópolis, o único então que aceitava crianças com essa idade, e onde fiquei até os 10 — conta o ator, pai da atriz Debora Bloch e da empresária Deni Bloch.
Outra circunstância que provoca identificação com os escritos de Manoel de Barros é o fato de encontrar beleza nas coisas insignificantes, “um sentimento de mundo parecido com o dele”, diz. E ainda a plasticidade sugerida nos poemas. Ele próprio artista visual, ainda que esta seja uma faceta menos conhecida de sua trajetória artística, o ator diz ter identificado, no universo lírico de Manoel de Barros, algo que sugeria o universo pictórico de Arthur Bispo do Rosário, artista que realizou a maior parte de sua produção (definida por ele como inventário do mundo) enquanto esteve internado na Colônia Juliano Moreira, diagnosticado com esquizofrenia paranoide.
— Comecei a pensar no cenário a partir dessas referências, o universo lírico de Manoel e o dos objetos do mundo utilizados por Bispo — conta Bloch, que assina a concepção cenográfica do espetáculo.
A equipe de criação conta ainda com figurinos de Cássio Brasil, trilha sonora de Alexandre Negreiros e luz de Bruno Cerezoli. A direção é do próprio ator, com supervisão de Emilio de Mello. Foi Emilio quem ajudou o ator a chegar à essência do espetáculo, a partir de três eixos encontrados na obra do poeta: a infância, personagens marcantes de sua vida adulta e um personagem específico, o Andarilho.
— Mas o espetáculo não é um pot-pourri virtuosístico de Jonas representando vários personagens do Manoel — diz Emílio. — Ele faz uma crônica poética, a partir de uma malha que tece a sua relação com o poeta e a sua relação com as artes plásticas, através da citação a Bispo. E que tem muito de dramaturgia. A própria poesia do Manoel trabalha com cenas, climas e tempos.
QUATRO FILMES A CAMINHO
“O delírio do verbo” chega ao Candido Mendes depois de ter estreado em julho, em praça pública, no 1º Festival Literário de Bonito (Flib), e de ter passado por várias cidades de Minas Gerais. A volta ao palco de Jonas Bloch, depois de quatro anos (ele integrou o elenco de “Turbihão”, de Domingos Oliveira, que fez temporada no Sesc Ginástico em 2011), está sendo compensadora, tanto no encontro mais direto com o público (“a poesia tem uma comunicação imediata”, diz) como no encontro com Emílio de Mello, que contribuiu para rejuvenescer sua interpretação.
Aos 76 anos, o ator está revigorado. Depois de encerrar um contrato de dez anos na TV Record, ele fez em junho uma participação na novela “Sete vidas”, da Globo, e aguarda a estreia de quatro filmes em que atua: “O escaravelho do diabo”, de Carlo Milani, com previsão para dezembro; “O outro lado do paraíso”, de André Ristum, que deve chegar aos cinemas em abril de 2016; “Louco amor”, de Marcos Schectman, ainda sem data de lançamento; e “Doidas e santas”, de Paulo Thiago, em fase de finalização.
“O delírio do verbo”
Onde: Teatro Candido Mendes — Rua Joana Angélica 63, Ipanema (2523-3663).
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Quando: Sex. e sáb., às 21h30m; dom., às 20h. Até 13/12.
Quanto: R$ 60.
Classificação: 12 anos.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/cultura/teatro/jonas-bloch-volta-ao-palco-com-manoel-de-barros-17663715#ixzz3ydnu8iBk
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