COMENTÁRIO
Mais Marias, menos Amélias
"Amélia não tinha a menor vaidade. Amélia que era mulher de verdade." Com esses versos, na primeira metade do século XX, Mário Lago imortalizou uma visão há muito perpetuada: a da mulher obediente, subjugada, do lar. Décadas depois, Milton Nascimento criou uma protagonista diferente: "Maria" era forte e batalhadora. Essa mudança, condizente com o ideário da época, não trouxe, porém, grandes reflexos no que tange à visão da mulher: ela continua sendo vista como inferior e vítima da violência. É preciso entender as manifestações desse mal, a fim de combatê-lo.
Primeiramente, é vital abordar a violência física contra as mulheres. Vivemos em uma sociedade historicamente patriarcal, que enraizou a imagem da inferioridade delas em relação aos homens. Isso faz com que mulheres ainda sejam espancadas por seus parceiros e não os denunciem, ou por medo de ameaças, ou por acreditarem que isso faz parte do amor, em uma sociedade que romantiza "50 tons de cinza". Além disso, é visível a perpetuação da cultura do estupro, que culpabiliza a vítima por usar determinados trajes ou ter certas atitudes, em uma inversão de valores típica do contexto brasileiro.
Em segundo lugar, não se pode esquecer da violência moral, ou seja, que denigre a imagem de uma pessoa. Com a perpetuação da internet, são inúmeros os casos de mulheres que têm fotos e vídeos íntimos compartilhados sem autorização, o que ratifica a objetificação do corpo feminino. Logo, engana-se quem pensa que a violência é somente física. A partir do momento em que se aceita que a presidenta seja rudemente xingada em uma manifestação, ou que mulheres ainda recebam salários menores do que os dos homens, esse tipo imoral ganha contornos assustadores.
Portanto, fica claro que a violência contra a mulher no Brasil persiste em muitos níveis. Como na natureza, em que nada se cria, tudo se transforma, é preciso um esforço mútuo para transformar essa realidade. Cabe ao governo fortalecer a lei Maria da Penha, com mais fiscalização e rigor nas penas. Ongs, por sua vez, devem denunciar abusos contra a mulher a partir de campanhas de conscientização. Já a escola deve propagar a igualdade de gêneros, já proclamada em programas como "He For She", da ONU. Só assim, Amélias virarão coadjuvantes em um cenário onde Marias prevalecem e podem, de fato, viver livres da violência – e a estranha mania de ter fé na vida não parecerá tão estranha assim.
Fonte:G1
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