O barulho do motor, o chiar da chaleira, o gotejar da chuva... Afetados pelo transe da memória, às vezes somos projetados para lugares (imagens) familiares, geralmente do passado, fortemente ligados ao nosso íntimo por meio de sons. Essa sensação foi transformada pelo grupo fotográfico – Cia da Foto – em uma instalação que transcodifica imagens em sons.
© Cia Foto, "Carnaval".
Carnaval é uma série composta por seis fotografias transformadas em paisagens sonoras. Ao extrair os códigos binários existentes nas fotografias tiradas durante o carnaval da Bahia, e comparando com arquivos digitais de músicas carnavalescas pesquisadas, foram achados bytes numericamente idênticos aos das fotos. Dessa comparação surgiu uma música.
© Cia Foto, "Carnaval".
O projeto, além de ser inovador na forma como se complementam expressões distintas, é uma obra de introspecção do sensível gera um forte impacto nos seus contrastes. A visibilidade da fotografia é audível a imagem é desconstruída e experimenta as fontes artísticas dentro do carnaval (fotografia e música).
Segundo a fotógrafa Carol Lopes, uma das idealizadoras do projeto, a ideia surgiu da insistência em tratar a fotografia como uma possibilidade que transcende a materialidade do objeto, da própria fotografia. Na época do trabalho, o grupo discutia as possiblidades de experimentar os limites que diferenciam as linguagens. A intenção primária da Cia da Foto foi na direção de transformar o procedimento do clique fotográfico em música, e não em imagem.
A escolha do carnaval como tema veio por conta da carga religiosa das fotografias. Carol Lopes complementa que no ensaio Carnaval as pessoas olham para cima; a isso junta-se a tonalidade dada às imagens, que trouxe uma atmosfera de uma certa religiosidade, que existe na origem dessa festa popular. “Uma religiosidade pensada não no sentido institucional ao qual o termo remete, mas em um sentido de êxtase, de descontrole da vida na religação dos corpos a um movimento determinado pela massa nas ruas. A fotografia do Carnaval teria o condicionamento de uma imagem que carrega sentidos aráuticos, transcendentes, épicos, etc.. Mas a música lhe garante uma postura iconoclástica. A junção dessas duas dimensões na instalação que propomos forma o sentido estético desse trabalho”, concluiu.
Para a Cia da Foto, a festa popular se estabelece pelo descontrole, onde as pessoas são mistura de algo imenso, imediato e imprevisível. A percepção do carnaval pelo grupo chega como uma espécie de distração no controle que tentamos impor à vida. Não sei qual poeta popularizou o termo “carnavalizar”, mas o certo é que tal verbo mais que perfeito (não como pretérito, mas como uma sensação de vida) sempre existiu e esteve alegoricamente em nossas bocas momescas. E durante o ritual do carnaval, em sua roupagem fantasiosa de ilusões e vestimentas, se alicerça uma brecha – como indicou Roberto DaMatta – de transformação da rotina e afirmação de indivíduos, numa concreta existência de fazer e ser visto. A visualização está em critérios de exposição como os captados nas fotografias da instalação Carnaval.
O grupo dá continuidade a essa pesquisa utilizando, numa próxima serie, a luminância e não mais o clique como princípio. O próximo trabalho irá se utilizar da geração de sons da intensidade luminosa nas imagens.
Carnaval teve a parceria do Dj Guab e foi exposto no Photoquai 2011, em Paris, e no New York Photo Festival 2011.
Leia mais: http://obviousmag.org/archives/2013/06/quando_se_ouve_uma_fotografia.html#ixzz2WzaL91Qt
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