Não falo de ideias ou tendências, pois a estas, todos tem direito, sejam elas as mais esquisitas que forem. Falo da linguagem mesmo, da palavra escrita, vítima indefesa de uma pancadaria como nunca se viu antes.
As manifestações de protesto contra o atual governo, que invadiram o Brasil nos últimos dias, revelaram uma violência assustadora, praticada contra a língua portuguesa.
Nas ruas, cartazes criativos e bem humorados nem sempre poupavam a gramática, mas até aí é aceitável, já que um povo que protesta pedindo, entre outras coisas, Educação, não pode ser lá muito letrado.
Assustadoras mesmo foram as manifestações on line. Qual terroristas sedentos, surgiram das mais sombrias e inesperadas esquinas de blogs, sites e redes sociais verdadeiras milícias, exércitos de sociólogos, analistas políticos, militantes variados, filósofos e jornalistas de última hora, praticando atos de selvageria contra o idioma. Não falo de idéias ou tendências, pois a estas, todos têm direito, sejam elas as mais esquisitas que forem. Falo da linguagem mesmo, da palavra escrita, vítima indefesa de uma pancadaria como nunca se viu antes.
Não foram poucas as vezes em que se fez necessário ler mais de uma vez o título surpreendente de uma matéria, para descobrir -por exemplo- que não estava acontecendo uma corrida rumo à Presidência da República em 2014 entre os manifestantes, mas sim, que entre eles, havia uma preferência pelo presidente do Supremo Tribunal Federal. Complicado.
Dilma Roussef fez um longo discurso onde informou ser a Presidenta do país (!) e acrescentou: “eu tenho a obrigação tanto de ouvir a voz das ruas, como dialogar com todos os segmentos” esquecendo que a “tanto” contrapõe-se “quanto”.
Entretanto, não se limitaram apenas contra a gramática as bombas de gás“lacrimogênico” que foram lançadas no Brasil da Copa das Manifestações. O léxico também não escapou ileso das bordoadas e balas de borracha.
Na ânsia de mostrar conhecimento e profundidade diante de fatos cujas razões estão nos subterrâneos do movimento socialista latino americano e de acesso limitadíssimo, surgiram as teorias das “sociologizações de demandas retroalimentadas pela teocracia fascistóide” ou “um suposto viés de frescor numa vinculação orgânica com aparelhos sindicais”. Ou ainda “a esquerda e a direita tradicionalmente conservadora entrelaçando o fator facista de momentos potencializados pela imprensa falso moralista”.
Dói, tanto chavão, tanto lugar comum, tanta teoria e tamanha falta de argumentação concreta, real, local. Frases que não possuem qualquer outra função além de tornar a linguagem escrita em português, inútil. Orações como estas foram ao ar minuto a minuto, acompanhadas pelo coro incessante e veemente da condenação à“depedração” física que acontecia nas ruas.
Não sou mestre em Letras Vernáculas; aqui e ali acabo tropeçando em alguma regra desta nossa língua realmente difícil, mas o que vi nestes últimos dias foi de entristecer ainda mais quem vive neste país.
Cresci vendo meu pai ler jornais impressos e neles pegava carona, por pura imitação como convêm às crianças, mas foi ali que aprendi a ler de forma prática para mais tarde aprender a escrever de forma clara, objetiva, direta e com um mínimo de elegância. Talvez nem tenha aprendido corretamente, porém é o que ainda até hoje tento. Assim, quando vejo essas epidemias de erudição artificial -ou até mesmo uma erudição autêntica- tendo como objetivo apresentar uma informação ou opinião ao público imenso que frequenta a internet, fico pasmo.
Acredito que a pessoa que deseja ler um texto complexo, mergulhar nele e decifrar cada frase, cada entrelinha, corre para Joice, Proust, Dante e tantos outros escritores densos e geniais. De preferência confortavelmente instalado numa poltrona, com uma saudável taça de vinho ao lado e um cachorro deitado por perto. Além de uma lareira acesa, claro, se for o caso.
Frente a um monitor ou com um tablet na mão e sabendo que no site ao lado alguma coisa já está mudando, o leitor espera clareza, síntese e -evidente- uma escrita sem erros, acho eu. Mas não foi o que se encontrou num momento em que a televisão e o rádio não davam conta de -ou não queriam- acompanhar os acontecimentos e a internet fazia isso com toda velocidade e mobilidade possíveis. O que chegou pela rede foi uma enxurrada de textos minados, com barricadas, barreiras e explosivos.
Nas ruas brasileiras e na internet, a língua portuguesa foi pisoteada de forma implacável. Buscando um lado bom em tudo isso que incendeia o Brasil, fica a certeza de que os protestos pedindo Educação de primeiro mundo são mais que necessários e urgentes
Como é possível tamanha perfeição e com tanta delicadeza,muito interessante e muito inovador!
ResponderExcluirEsse blog tem cultura e inovação com muita perfeição..Ótimo gostei muito
DE:Priscila Matos
(aluna da professora Aline Carla,no C.E.C.J.)
Muito obrigada minha querida! Bjs.
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