terça-feira, 8 de janeiro de 2013

DO PAGODE AO INDIE ROCK, DE RAÇA NEGRA A PIERRE BOURDIEU

Em outubro foi lançado o projeto Jeito Felindie, idealizado pelo jornalista Jorge Wagner, onde alguns artistas da cena do indie rock nacional prestam tributo à banda Raça Negra. O teclado deu lugar às guitarras e o pagode virou pop rock. Inusitado? Nem tanto assim, basta conferir o álbum que está disponível aqui


Foto: divulgação.

A intenção do também produtor Jorge Wagner era, segundo algumas entrevistas sobre o projeto, além de prestar uma homenagem à banda que serviu de trilha sonora para muitos romances (inclusive os desfeitos), se divertir com a união de dois gêneros musicais que, desde que o mundo é mundo, seria bastante improvável. Este é o motivo pelo qual a iniciativa ainda gera opiniões distintas.

São 12 músicas na versão de 12 artistas que têm na bagagem um repertório que vai do eletro ao folk. O estilo do álbum, contudo, é simples: música pop.


Foto:divulgação.

Por que um tributo a um estilo musical diferente do que tais artistas costumam ouvir, tocar e se identificar? Ao ouvi-los, a sensação imediata que se tem é que todos estão ali bem mais do que para interpretar algumas das músicas mais tocadas por uma década nas rádios do Brasil, mas pra reviver, por alguns instantes, seus momentos pessoais que foram contemporâneos ao auge da banda.

O auge do pagode foi nos anos 90, o do rock aconteceu na década anterior. Mas a questão é: por que o gosto por um estilo musical historicamente aclamado é motivo pra subestimar outro estilo cuja identidade não se assemelha? A erudição do rock (e suas vertentes), por parte dos seus representantes e fãs, ainda sobrevive diante do que surgiu posteriormente. Toda a arte com apelo popular tende a ser discriminada e esteticamente desvalorizada por quem se diz dotado do código que permite decifrar obras admiráveis.
O gosto classifica aquele que procede a classificação: os sujeitos sociais distinguem-se pelas distinções que eles operam entre o belo e o feio, o distinto e o vulgar – Pierre Bourdieu.




Fonte: Google.

Para Pierre Bourdieu, filósofo e sociólogo francês, não há nada que distinga tão rigorosamente as diferentes classes, quanto o consumo de obras de arte e o ponto de vista estético. Os agentes sociais, por meio de um conjunto de regras (quase sempre inconscientes), definem todo tipo de gosto e comportamento, assim como sua visão de mundo. Tais regras são tão arraigadas em nosso corpo, que os indivíduos não percebem que essas disposições são de ordem cultural.

Desse modo, o interesse estético por meio de expressões artísticas diversas, une e separa as pessoas em grupos sociais por condições de existência. Gostar de um determinado estilo de objeto artístico – seja música, literatura, artes visuais etc. -, limita a possibilidade de admiração de algum objeto que se oponha ao primeiro em forma ou em conteúdo. É como se a maneira pela qual você classifica determinado objeto – belo ou feio, determine o modo como você será classificado. Assim, o gosto é uma prática que carrega a diferença como algo inevitável. É uma prática que distingue as classes.


Fonte: divulgação.

Grande parte do repertório do grupo Raça Negra, que tem como compositor o também vocalista da banda Luís Carlos, fala dos sentimentos passionais, das dificuldades de uma relação a dois (às vezes até a três), de amores platônicos, adultério e todas as alegrias e frustações dos relacionamentos amorosos. Na banda há bons músicos. Nas músicas, bons arranjos. Então, por que esperar mais do que eles se propõem a fazer se para o público ainda fiel, eles correspondem a sua necessidade musical?

Porque a apreciação da obra depende também da intenção do espectador e este, por sua vez, molda esta relação sob uma determinada necessidade social. Para a estética dominante, ao contrário, a arte deve ser desinteressada, não pode ser objeto de interesse comum. Usufruir dela pressupõe-se que seja necessário haver um distanciamento, pois quanto maior for a distância da necessidade, maior a contemplação. Esse é o princípio da valoração: ser raro.

Se há necessidade de um sentido, a importância desse projeto é simples: a união de estilos musicais socialmente distantes, ultrapassando o tradicionalismo conservador presente em nossa cultura. Mais do que isso, como é próprio da arte, fica por conta de quem se permitir experimentar.
Fonte;Obvious.

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