terça-feira, 13 de novembro de 2012
A PRIMEIRA FRASE: UMA LEITURA DE KAFKA E DE OUTROS ESCRITORES
Pegue um livro e leia a primeira frase. Este (nem sempre) breve conjunto de palavras tem um enorme peso em todos os outros que se seguirão até o último ponto. Contém traços do estilo de seu autor que, em certos casos, o elevam ao máximo. Alguns são mestres em criar frases para abrir suas obras e, em consequência disso, indispensáveis.
© Jack Kerouac, 1956 (Wikicommons).
Francine Prose, autora de “Para ler como um escritor – Um guia para quem gosta de livros e para quem quer escrevê-los” (2008, Jorge Zahar Editor), organizou . Sua maneira de ensinar análises e citar obras obrigatórias revela que para os iniciantes da arte da escrita a paixão é pedra fundamental. Uma das lições iniciais de seu livro fala sobre a insuperável importância da frase de abertura das obras. Grande parte dos escritores é apaixonada por construir belas frases, principalmente esta primeira, fundamental.
Prose aponta a leitura desacelerada e atenta como método para o trabalho estilístico - em alguns casos levado ao extremo – não passar despercebido. Dada a importância da primeira frase, é ela que evidencia o que será desenrolado pelo resto das páginas e define se o leitor seguirá até o fim.
Não importa o tamanho ou o rebuscamento; a frase pode tanto conter apenas quatro palavras como ser abarrotada de subordinações ordenadas em cascata. É ela que desencadeia o mistério, revela o estilo, introduz a trama, em suma, captura o leitor.
É notável como, de acordo com Prose, os autores dão importância a isso. Tanto os por ela citados como os escolhidos ao acaso. Jack Kerouac, escritor cerne da geração Beat, logo de cara joga o leitor no meio de suas andanças e peregrinações sem roteiro que, desenroladas, não acabam necessariamente com o fim do livro. Sem rodeios, Kerouac quer mesmo transmitir certa falta de noção em suas grandes viagens, e faz isso bela e energicamente, levando o leitor junto, sem lenço nem documento. Ernest Hemingway constrói com clareza quase infantil. Philip Roth entrega em poucas linhas as agonias de seus protagonistas. Escritores latinos, como Gabriel Garcia Marquez e Roberto Bolaño, iniciam normalmente com reflexões do personagem ou do ambiente em que estão. O leitor deve permanecer por algum tempo lendo até se encontrar - depois, não há mais como fugir.
© Ernest Hemingway em sua casa em Cuba, 1953 (Wikicommons).
Com Kafka, segundo Prose, tem-se muito a aprender. Foi um exímio construtor de frases; um mestre das linhas de abertura – e das frases ao longo de todas suas obras. Buscava as doses certas nos momentos certos, logo, a frase primordial tornava-se de extrema importância para a sincronia do que viria a seguir.
© Kafka, estátua em Praga, (Wikicommons).
Em A Metamorfose, obra largamente lida e estudada em todo o mundo , Kafka abre com “certa manhã, ao despertar de sonhos intranqüilos, Gregor Samsa encontra-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso.” Tão vastos são conteúdo e importância presentes apenas nessas poucas palavras que toda uma análise poderia ser construída sobre a curta introdução. Uma incógnita tão grande quanto a traição de Capitu na obra de Machado de Assis (outro escultor de frases) são as questões que se levantam em torno de Gregor Samsa: quem era, por que se tornara um inseto monstruoso e ainda que inseto monstruoso era esse. Atravessada a primeira frase e logo a primeira página, o caminho é um só.
Leia mais: http://obviousmag.org/archives/2012/11/a_primeira_frase_um_ensaio_sobre_kafka_e_outros_escritores.html#ixzz2C3OnHlur
Querida que belo post.Trazer uma análise tão importante sobre a importância dada por escritores famosos sobre a primeira frase de seus livros, com certeza vai alargar nossos horizontes como leitores(as).
ResponderExcluirParabéns!
Brisas e flores para você.
Bjs Eloah
Tentei fazer um comentário em sua postagem "Inquieta", mas desta vez não foi deve ter sido por causa da lentidão da minha net.
ResponderExcluirSempre estou em seu espaço bebendo de suas palavras. Parabéns amiga por tudo que tens escrito!
Achei interessante pensar sobre as primeiras frases de livros que lemos e também sobre aquelas que escrevemos. É uma honra constante tê-la aqui. Obrigada e beijos!