SEJA BEM-VINDO!

A ARTE RENOVA O OLHAR!

sexta-feira, 6 de junho de 2014

A DECADÊNCIA DO SISTEMA DE ENSINO EM O SUBSTITUTO


Professores humilhados, alunos agressivos e um sistema de ensino que beira a falência. O Substituto é um filme necessário por ser uma ficção extremamente real. Assista e, caso se assuste, continue assistindo.



O Substituto (2011) é um filme intenso e chocante de Tony Kaye, que anos antes havia dirigido Uma Outra História Americana. O filme foi lançado no Brasil direto para locadoras, o que não parece plausível, afinal, seu tema e produção são impecáveis.

Adrien Brody interpreta o professor substituto Henry Bates, que tem uma filosofia de trabalho curiosa: ele não é substituto por limitações curriculares ou por não conseguir cargos permanentes, mas sim por opção. Henry é o tipo de professor que não quer aproximação com seus alunos e nem com seus companheiros de trabalho.



Ele foi chamado para cobrir as aulas de um professor que desistiu, que perdeu completamente as estribeiras com sua sala de aula e com sua profissão. Não é para menos, a escola em questão se localiza no subúrbio de Nova York, está decadente e é recheada de alunos sem o menor senso de respeito pela figura do professor.

 
Adrien Brody como o professor substituto Henry Bates.

Este texto contém Spoiler.

A escola

A escola retratada em O Substituto é o sinal da falência do sistema de ensino americano. É aquilo que vemos em documentários e entrevistas, mas transformado em ficção. E choca pela vivacidade das cenas. Num dado momento, um professor pede a atenção da sala, para mostrar um filme aos alunos, mas ninguém se importa com a sua presença. Já em outro momento, uma aluna ameaça a professora que a tinha expulsado da sala - “se você me expulsar de novo, os amigos do meu irmão irão vir aqui pra te estuprar”.

Henry acolheu Erica em seu apartamento.

Um dos professores agarra-se nas grades do jardim da escola, fazendo movimentos de súplica, inteiramente desnorteado e tão arrasado quanto um cavaleiro que acabou de perder a batalha. Esta cena é mostrada duas vezes. Na segunda, Henry vai até o professor e pergunta, “O senhor está bem?”, assustado, o professor responde a Henry, “Você consegue me ver? Oh, Deus, isso é tão cruel. Obrigado”. Ser visto, ser o objeto de atenção, ser respeitado e ser reconhecido enquanto um ser humano que tem necessidades básicas de afeto e amor é realmente difícil para estes professores. Conseguir ser visto é conseguir ser sentido. A invisibilidade é cruel, a indiferença é cruel, a vida como professor - que é diariamente exposto a intensas pressões - é cruel.



Manter-se agarrado às grades da escola, num movimento de súplica e desespero é um pedido para voltar a estar vivo. Não é exatamente assim que muitos professores se sentem em qualquer parte do mundo, inclusive no Brasil? Segundo Camus, há somente duas opções: rebelar-se ou o suicídio, o restante é arrastar a carne pelo mundo sem uma existência significativa. Sob este ponto de vista, a maioria dos professores não está somente se arrastando? Quando lecionar passa a ser um movimento repetitivo e rotineiro, quando perde sua dinâmica de criatividade, quando vira unicamente um processo robótico e mecanizado de “passar conteúdos e aplicar exames”, então, perde-se toda a vivacidade da profissão.

É nesta escola que Henry encontra Meredith, uma jovem acima do peso que sofre bullying por sua condição. Ela tem um talento especial para as artes, um interesse forte em fotografia e colagens, mas nenhum apoio em casa. Sua vida é um mar de cobranças absurdas feitas por seu pai, que a quer magra e feliz. Dentro do enredo do filme, Meredith é uma das mulheres que serão essenciais para a trajetória de Henry.

Meredith é a que mais precisa de ajuda.

A professora Sarah Madison, apesar de ter um papel pouco expressivo, seria a segunda mulher essencial para Henry. Se Meredith é aquela que o faz agir ativamente em prol de uma aluna, que o faz sair do campo da indiferença, Sarah é aquela que o aproxima dos colegas de trabalho.

A prostituta

Entretanto, é Erica que mais vira seu mundo. Erica é uma prostituta jovem que Henry conhece por acaso enquanto voltava para casa. Dele, Erica recebe carinho, amor, um abrigo e atenção, em troca não precisa dar nada. Henry não tem a menor vontade de receber algo em troca, ele dá um lar a uma estranha, cuida de seus ferimentos (resultado dos abusos que sofrera enquanto garota de programa) e lhe dá de comer. Uma cumplicidade nasce nesta relação, até que Henry decide que o melhor para Erica é ser levada pelo conselho tutelar. O laço entre eles estava ficando cada vez mais denso e mais forte, ele não aguentaria muito tempo e preferiu desistir de ter a responsabilidade de ser alguém importante para a garota.



Lucy Liu faz o papel de uma orientadora no colégio falido de Nova York.

A preocupação de Henry é não ser bom o bastante. É não conseguir aguentar o peso de ser uma referência tão forte para alguém. Sua escolha em ser professor substituto tem total relação com a desistência em manter-se próximo de Erica. Não há espaço para aproximações.

Suicídio simbólico

Ainda temos o suicídio de Meredith, que não aguenta viver rodeada de pura rejeição. Este ato é a simbolização da falência geral do sistema de ensino. Não se trata somente de professores subestimados, humilhados e desmotivados. Há também alunos sem o menor apoio na base social. Os alunos vão à escola prontos para não gostarem dela. São alunos depressivos, agressivos, psicopatas que matam gatos pelo prazer da tortura. São sádicos adolescentes.

Alguns pensadores tratam o sistema de ensino como um reprodutor das desigualdades da sociedade em que ele está localizado. Se trata, então, de ver o sistema de ensino não como algo que está degradado e que não consegue cumprir seu papel, mas como algo que está, de fato, cumprindo seu papel, mantendo as desigualdades que já estão na sociedade e ensinando de modo diferenciado para diferentes parcelas da sociedade – pobres devem aprender menos.



O professor desmotivado, o aluno desmotivado, a escola violenta, e todas essas características não tão diferentes do sistema de ensino brasileiro, completam o nascimento de uma escola que foi feita pra não ensinar, uma escola que foi feita para adestrar e para ser fábrica de subempregados pós-modernos.

Abaixo o trailer: 

Nenhum comentário:

LinkWithin

.post-body img{ -webkit-transition: all 1s ease; -moz-transition: all 1s ease; -o-transition: all 1s ease; } .post-body img:hover { -o-transition: all 0.6s; -moz-transition: all 0.6s; -webkit-transition: all 0.6s; -moz-transform: scale(1.4); -o-transform: scale(1.4); -webkit-transform: scale(1.4); }