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domingo, 26 de fevereiro de 2012

Os Amantes, de René Magritte - Crítica à Modernidade Líquida


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Os Amantes
Eu creio que uma leitura contemporânea - e fadada ao desprezo do próprio René Magritte, afinal, seria uma leitura onde nem os métodos (no sentido filosófico, ou seja, desprezando o contexto histórico e os objetivos da obra como crítica e expressão social) do autor seriam respeitados - pode ser feita na obra Os Amantes, de 1928. Se uma obra é imortal, ela o é por representar uma situação eterna, cristalizada, ou por poder ser lida conforme novas coordenadas e ainda assim, ter uma mensagem para expor.
Por isso eu creio que esse quadro pode ser a expressão da falta de comunicação na ilusão da própria comunicação, a conexão da modernidade líquida contrapondo a relação das velhas sociedades ditas lentas, baseada numa responsabilidade mútua. Pois, notem, apesar do quadro mostrar um casal se beijando, o beijo, a relação firmada, é interrompida (até mesmo evitada, pode-se dizer) pelos sacos na cabeça de cada amante. São amantes líquidos. Amantes que não querem o obstáculo do outro para obstruir seus rios tão ávidos por movimento.
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Em nossa sociedade dita pós-moderna, todos os entraves que possam, de alguma forma, interromper a maneira individual de se gozar a vida, precisam ser evitados. A insegurança em não entender a complexidade do outro e a incapacidade de, simplesmente, não destruir sua alteridade, a descartando como refugo da sociabilidade, favorece às formas superficiais de relacionamento, onde o termo conexão é muito bem colocado por Bauman, afinal, nada mais fácil e livre de qualquer culpa e responsabilidade do que se desconectar – quebrar um laço já frágil.
É aqui que Durkheim entra, já que sua interpretação/leitura/método sociológico, onde, quanto maior a divisão do trabalho em uma dada sociedade, maior a autonomia das consciências individuais em relação à consciência coletiva (esta, por sua vez, é a esfera onde as consciências individuais se aglutinam em valores e normas, assim como em expectativas e em toda simbolização social, formando uma realidade sui generis.
Por definição, todo humano é duo: é individual/físico (para usar o termo de Durkheim) e social, ou seja, tem certas ações e pensamentos seus, que destoam da sociedade e de suas regras gerais, mas também tem outros que são assimilados pela vida em sociedade, por coerção social, em aparelhos estatais ideológicos e repressivos, utilizando a definição de Althusser, como a escola, a religião e o direito. O que acontece quando estas normas não são fortes ou regularizadas, nem mesmo rigidamente aplicadas pelo aparelho estatal? Um estado de desordem toma conta da sociedade. Para este estado, Durkheim deu o nome de anomia.
Eu diria que a modernidade líquida é um estado anômico e extremamente individualista. As normas básicas do cotidiano são subjetivadas até serem regras do eu e fundadas através da arbitrariedade do próprio eu. Essa é a pura desordem. É assim, então, que raciocínios de auto-valorização exacerbada são considerados normais e até incentivados à reprodução – um famoso é o “já me dei muito mal ajudando os outros, hoje eu penso em mim, depois vejo se sobra algo pros outros”. Óbvio que a solução não está em uma falsa solidariedade filantrópica, mas este tipo de argumentação é revelador quando levado em consideração todo o contexto em que ele é emitido.
Rousseau, no Discurso Sobre a Origem da Desigualdade Entre os Homens e no Contrato Social, já traduz essa forma egoísta de vida individual, conceituando o amor-de-si e o amor-próprio, onde o último é a forma individualista de dar valor a si próprio sem entender que a vida em sociedade é mais que a realização cega dos próprios objetivos, enquanto o primeiro é a consciência do eu, o instinto de sobrevivência básico e primitivo do ser humano. Nesta perspectiva, o amor-próprio surge na vida em sociedade, porém é um mal à ela, pois este amor exalta o eu em detrimento do interesse geral, unificado, da sociedade.220px-Wolleh_magritte.jpg
O inferno, desta forma, realmente são os outros, eles realmente são o empecilho em nossas realizações pessoais (enquanto imersos em amor-próprio rousseauniano) e neste ponto o quando se faz novamente atual. A falta da visão, do olfato e até mesmo do contato entre a boca (simbolizando a real ausência de um relacionamento) não anula um beijo, mas permite que ambos estejam livres para experimentar o máximo de não bocas que puderem (em nossa sociedade hedonista/consumista, gozar é imperativo, gozar é superego), quando a qualidade é diminuta, a quantidade tenta tomar o espaço que sobra. A barreira entre a relação permite esta ser substituída pela conexão e, mais importante, pela desconexão, quantas vezes for o desejo

por  .
Leia mais: http://lounge.obviousmag.org/hepatopatia_cronica/2012/02/os-amantes-de-rene-magritte---critica-a-modernidade-liquida.html#ixzz1nViiS2hb

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