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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Luiza me escreve uma carta

Roberto Gomes

 Haverá um dia em que minha neta Luiza – que completou um ano no dia 11 passado
 – sentará a meu lado e me perguntará, como quem consulta um velho alfarrábio:

- Vô, o que é uma carta?

Eu, quem sabe meio esquecido ou confuso, talvez fique pensando a que carta ela estará se referindo. Carta de baralho? Carta náutica? Carta celeste?

- Ah, sim, carta! exclamarei afinal.

E terei uma enorme dificuldade em explicar do que se trata.

Uma carta exigia certa cerimônia, além de data, texto e assinatura. Implicava um tratamento, por exemplo. Uma certa linguagem que, dependendo do destinatário, não poderia ser banal nem usar gírias.

Também não se escrevia carta a qualquer momento. Era preciso criar o momento propício para uma carta. Eu – e direi isto à Luiza – gostava de escrever cartas à noite, depois que as tarefas do dia haviam rendido sua inutilidade, numa escrivaninha junto à janela e fumando alguns cigarros. Parecia romântico e inspirador. Outros preferiam um cálice de conhaque.

O papel devia ser limpo, alvo, imaculado. Qualquer amassado ou rasura e a carta iria pro lixo. Recomeçava-se. Aliás, eram feitas várias versões.

- Isto se chamava “passar a limpo”, Luiza. A gente escrevia e, depois, copiava tudo de novo, com letra melhor, corrigindo os tropeços gramaticais, caprichando na caligrafia.

- Caligrafia, vô?

- Bom, isso eu explico amanhã. Voltemos à carta.

Dependendo de quem fosse o destinatário, da maior ou menor habilidade do remetente, do estado da caneta – aliás, chamadas “canetas tinteiro”; um dia eu explico –, uma carta poderia exigir meia dúzia de versões. A letra, é claro, precisava ser legível, o que seu avô jamais conseguiu, apesar dos esforços que fez.

Era preciso falar do tempo, contar as últimas...

- Que últimas?

- As últimas notícias, Luiza. Não havia jornal das oito. Aliás, não havia televisão.

Aqui Luiza, abismada, abrirá uns olhos enormes, talvez se indagando de onde teria saído aquele avô tão remoto e pré-histórico.

Embaraçado, eu continuaria:

- Bom, depois a gente escrevia a respeito do assunto principal da carta. Começava assim: “o que me leva a escrever...” Quando estudante, eu escrevia a meu pai pedindo um aumento de mesada. Ou escrevia a minha mãe anunciando o dia em que chegaria de viagem, pedindo que me recebesse com uma tainha ao forno. Outros escreviam para discutir problemas familiares, profissionais, contar das últimas namoradas, de um filme lançado aqui em Curitiba e que só chegaria a Blumenau no ano seguinte.

Depois, era só colocar num envelope, selar e levar ao correio.

- Levar ao correio? ela perguntaria. Não é...

- Não. Não é como o e-mail, direi.

- Ah, sei. E por que não escrevia naquela máquina ali?

Luiza apontaria para uma máquina de escrever portável que conservo numa prateleira e na qual datilografei meus primeiros livros.

- Era considerado falta de educação. Carta devia ser manuscrita. Só muito depois é que se começou a aceitar carta datilografada, mas aí eu não era mais adolescente.

E Luiza me olhará com olhos deslumbrados, como se estivesse ouvindo uma história que fosse produto da mais delirante fantasia.

Enfim, precisarei explicar à Luiza que o e-mail – que é tão prático, tão rápido, tão bom – acabou com a mágica das cartas. E ela, menina sensível e imaginativa, ficará maravilhada justamente por conta desta magia perdida. Cartas guardadas, segredos manuscritos, as últimas notícias, confissões íntimas, inquietações da alma. Tudo isto deixará Luiza com a imaginação acesa. E ela entenderá que carta não é um e-mail mais longo. É outra coisa. Assim como um romance não é um conto comprido. É outra coisa. Assim como um amor não é uma atração duradoura. É outra coisa.

E um dia Luiza pegará uma caneta (tinteiro, ainda restará alguma), se sentará numa sala quieta e, sob uma lâmpada pálida, talvez preocupada, talvez com saudades, colocará uma data sobre um papel imaculado e escreverá:

“Querido vovô,”

E descobrirá o que é uma carta.

18 comentários:

Anônimo disse...

Querida professora aqui quem esta postando um comentário e a Suzy Buy da turma:901.
Esse texto é muito interessante por que me faz lembrar,que escrever cartas não é somente pegar um papel ,uma caneta mas sim; explessar os seus sentimentos e sua maneira de pensar nesta carta.
Beijos,Suzy

Aline Carla Rodrigues disse...

Isto mesmo Suzy! Amei sua participação! Beijos.

Anônimo disse...

Olá.
Achei o texto lindo, pois deixa no ar aquele gostinho de saudade, saudade de meus avós, que também contavam histórias pra mim. Acho que a melancolia dos velhos tempos, tempos de meus pais, de meus avós, também é nossa, quando lembramos deles, e como sabiam viver. Não precisavam de muito, e pra expressar, se comunicar, apenas caneta e papel,e um cantinho sossegado. Eu sou a Agatha Batista, turma 902, Colégio Chequer Jorge. Ah, parabéns pelo blog. Ficou muito bom.

Aline Carla Rodrigues disse...

Olá Agatha! É um prazer tê-la aqui! Você escreve muito bem e tem muita sensibilidade! Obrigada pelo seu comentário. Um grande abraço!

Anônimo disse...

Olá professora Aline.
Gostei muito do texto, ele é lindo. Foi muito bom voc~e ter falado sobre cartas, daqui um tempo as crianças vão ter saudade de uma coisa que elas não tiveram, não conheceram, só mesmo pelas histórias que seus avós vão contar, o modo de como fazia uma carta, que hoje em dia quase não se usa. Adorei descobrir que elas deberiam ser manuscritas, que era falta de educação datilografar elas, que era refeita várias e várias vezes até ficar perfeita e precisava só de um cantinho calmo pra fazê-las. Eu sou a Wellita Borges, turma 902 do CECJ. Adorei o blog, ele está bombando. Beijinho.

Aline Carla Rodrigues disse...

Querida Wellita, suas descobertas fizeram o meu dia melhor! Como é bom ter empatia! Amei o seu comentário e tenho certeza que poderás escrever bem melhor uma carta depois de ter lido este texto. Beijos!

Anônimo disse...

Olá professora Aline.
Gostei do texto, ele é lindo,por que daqui um tempo muitas crianças vão ter curiosidades de uma coisa que elas não tiveram,e não conheceram mais que elas vão conheceram por que seus avós vão contar para elas.Esse texto me fez lembrar da época que eu era pequena que meus pais e avós que contavam histórias pra mim.Pra voce escrever uma carta voce tem que colocar amor, sentimentos, alegria e carinho.Eu sou a Ana Paula Souza,turma 902, Colégio Chequer Jorge. Ah, eu gostei muito do seu blog,ele ta bombando muito.Beijinhos.

Aline Carla Rodrigues disse...

Querida Ana Paula, como é bom ter seu comentário no TRIBARTE, senti que o texto trouxe nostalgia à sua vida, e isto é sensacional! Obrigada por sua participação! Beijos.

Anônimo disse...

amei amei gostei muito !!!
aki é a Laila tah
da 901

Julianna Alves disse...

Oi Professora.Achei o texto muito interessante.
A tecnologia tem se expandido tanto, que até algumas crianças de hoje, não sabem como escrever ou até mesmo o que é carta.
Foi interessante saber que as cartas não poderiam ter nenhum amasso ou alguma rasura e que reescreviam varias vezes para ficarem perfeitas.
Ameei o texto, concerteza vai me ajudar muito nas aulas .
Sou a Juliana Alves turma 902
beijooos

Aline Carla Rodrigues disse...

Amei o seu comentário e participação. Beijos.

Vívian Boechat disse...

olá professora,
hoje em dia é muito difícil ver alguém escrevendo carta pois a tecnologia a cada dia cresce mais na sociedade e cada vez mais jovens e principalmente crianças estão nesse ramo...
este texto é super lindo e fala o quão perfeito é escrever uma bela carta...
daqui a alguns tempos crianças nem vão querer saber o que é carta de dão sofisticado que está o mundo; o Quão duro será?....
O mundo todo daqui a alguns tempos empresará seus sentimentos por e-mail e etc..
Sou Vívian Souza da 902 CEJG
beijos vivian
ja estou seguindo como " POSTCÂO" rsrs é o meu blog
beijos xau

Aline Carla Rodrigues disse...

Eu também sigo o seu blog Vivian, que notícia maravilhosa minha aluna tem um blog e faz comentários pertinentes! Estou muito feliz com sua postura diante da vida. Obrigada pela participação. Beijos!

Vívian Boechat disse...

obrigada por seguir o meu blog..
achei muito interessante o seu...
professora, você já deu aula para meu irmão o joão vitor que estuda no IFF acho que você não lembra rsrs
entao é isso um beijo
XAU AUS AUS

Aline Carla Rodrigues disse...

Vivian é sempre um prazer encontrarmos a família de nossos queridos! Mande um grande abraço para seu irmão e diga que sinto saudades dele.
Muito obrigada por seu carinho e pela participação ativa no TRIBARTE. Beijos.

Aline Carla Rodrigues disse...

Vivian é sempre um prazer encontrarmos a família de nossos queridos! Mande um grande abraço para seu irmão e diga que sinto saudades dele.
Muito obrigada por seu carinho e pela participação ativa no TRIBARTE. Beijos.

Vívian Boechat disse...

oii professora,
pode deixar que digo sim..
ele tabém falou que sente muita saudade de você..
e que também te adora muito e adora seu blog..
tanta coisa interessante que tem aqui.
adorei seu blog..
e nos que somo blogueiras temos que ler tudo o que vimos para ficarmos muito bem informados sobre tudo o que acontece neste mundo tão grande né?
assim como leio tudo assim sei que vocÊ também lê..rsrsrs
adoro suas aulas e fiquei muito feliz de você ter blog.. e esta neste ramo juntamente comigo..
valeu prof..
te adoro um beijoo

Aline Carla Rodrigues disse...

Com certeza a leitura é o caminho da aprendizagem. Amo você! Beijos e obrigada!

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